14/05/2024 – Infelizmente, a tragédia climática que assola o Estado do Rio Grande de Sul já ceifou a vida de mais de cento e quarenta pessoas, destruiu famílias, suas casas e, sem dúvida, inúmeras empresas deixarão de existir.
Nota-se estar havendo um esforço nacional por parte de todas as esferas de Poder(municipal, estadual e federal) e da sociedade civil para atenuar ao máximo as consequências dessa desgraça, com recursos, ações, leis etc.
A prioridade atual está sendo salvar vidas, porém, quando a água abaixar e a vida bater na porta das pessoas, estas talvez não tenham mais como sequer voltar ao trabalho, pois as empresas simplesmente deixarão de existir.
Nessa linha, tem-se que o direito do trabalho traz arcabouço normativo que objetiva lidar com fatos como a extinção da empresa em casos de força maior.
Mas o que seria força maior?
Para o direito, caso de força maior envolve fato jurídico stricto sensu extraordinário ou irresistível, por ser originário de fato da natureza que produz prejuízo.(DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico – São Paulo: Saraiva, 1988)
Não iremos aqui adentrar na questão da culpa do Poder Público pelo fracasso na implementação de políticas preventivas ou que poderiam ter atenuado as consequências desses acontecimentos.
Vamos, por presunção, assumir ter havido força maior, que parece ser, ao menos por agora, o mais razoável.
Assim, por força de lei, a extinção da empresa é inserida, grosso modo, dentro do poder diretivo do empregador, conclamando-se, a todas as luzes, risco empresarial (artigo 2º da CLT), que, como consectário, transfere a empresa/empresário o ônus de sua atividade.
Em regra, assim, deve pagar as verbas rescisórias devidas caso decida encerrar sua empresa.
Porém, não há propriamente qualquer elemento volitivo do empregador/empresário em casos de força maior, como o que ocorreu agora no sul do país.
Em razão disso, os artigos 501 e 502 da CLT estabelecem o seguinte:
Art. 501 – Entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente.
parágrafo 1º – A imprevidência do empregador exclui a razão de força maior.
parágrafo 2º – À ocorrência do motivo de força maior que não afetar substancialmente, nem for suscetível de afetar, em tais condições, a situação econômica e financeira da empresa não se aplicam as restrições desta Lei referentes ao disposto neste Capítulo.
Art. 502 – Ocorrendo motivo de força maior que determine a extinção da empresa, ou de um dos estabelecimentos em que trabalhe o empregado, é assegurada a este, quando despedido, uma indenização na forma seguinte:
I – sendo estável, nos termos dos arts. 477 e 478;
II – não tendo direito à estabilidade, metade da que seria devida em caso de rescisão sem justa causa;
III – havendo contrato por prazo determinado, aquela a que se refere o art. 479 desta Lei, reduzida igualmente à metade.
Em resumo, verificada a força maior, a indenização devida fica reduzida pela metade em casos de contrato por prazo indeterminado e, nos contratos a termo, também à metade da indenização prevista no art. 479 da CLT.
Quanto à multa do saldo depositado junto ao FGTS, reduz-se a 20% (artigo 18, § 2º, Lei n. 8.036/90).
Claro que tudo estará condicionado a demonstração de que, realmente, a empresa foi extinta em razão da força maior, não se justificando o pagamento pela metade em se tratando de empresa que apenas passaram a enfrentar dificuldades financeiras.
É o que se extrai, mutatis mutandis, a partir de precedentes do C. TST relacionados à pandemia, a saber:
“AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. 1. FORÇA MAIOR. PANDEMIA DE COVID-19. INAPLICABILIDADE DO ART. 502 DA CLT. CONHECIMENTO E NÃO PROVIMENTO. I. O art. 502 da CLT prevê que ” ocorrendo motivo de força maior que determine a extinção da empresa, ou de um dos estabelecimentos em que trabalhe o empregado , é assegurada a este, quando despedido, uma indenização na forma seguinte: I – sendo estável, nos termos dos arts. 477 e 478; II – não tendo direito à estabilidade, metade da que seria devida em caso de rescisão sem justa causa; III – havendo contrato por prazo determinado, aquela a que se refere o art. 479 desta Lei, reduzida igualmente à metade “. II. Do quadro fático delimitado no acórdão regional é possível verificar que a Reclamada já descumpria obrigações relativas ao contrato de trabalho do Autor antes mesmo do início da pandemia e que, apesar dos efeitos drásticos da pandemia, não houve a extinção da empresa ou do estabelecimento em que a parte Reclamante trabalhava. III. No caso, muito embora a pandemia da COVID-19 tenha causado grande impacto econômico na empresa Reclamada, não restou comprovado o cumprimento de todos os requisitos do art. 502 da CLT, uma vez esse motivo inevitável não causou a extinção da empresa. IV. Salienta-se que já há decisões desta Corte Superior no sentido de que a pandemia de COVID-19 não configura motivo de força maior apta a enseja a aplicação do art. 502 da CLT. V. Fundamentos da decisão agravada não desconstituídos. VI. Agravo de que se conhece e a que se nega provimento, com aplicação da multa de 2% sobre o valor da causa atualizado, em favor da parte Agravada, com fundamento no art. 1.021, § 4º, do CPC/2015″ (Ag-AIRR-10109-23.2021.5.03.0101, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 06/05/2022).
“AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA – DESCABIMENTO. RITO SUMARÍSSIMO. PARCELAS RESCISÓRIAS E MULTA DO ART. 467 DA CLT. FORÇA MAIOR. PANDEMIA DE COVID-19. INAPLICABILIDADE DO ART. 502 DA CLT. A pandemia de Covid-19 não configura motivo de força maior apto a ensejar a aplicação do art. 502 da CLT. O motivo alegado pela ré caracteriza imprevidência patronal, prevista no § 1º do art. 501 da CLT. Agravo conhecido e desprovido” (Ag-AIRR-10926-24.2020.5.03.0101, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 12/11/2021).
Portanto, no caso do Rio Grande do Sul, em sendo a empresa extinta em decorrência da catástrofe climática, em regra, a indenização devida pela empresa ao empregado seria reduzida à metade.